São Francisco de Sales
Seja
sincera tua linguagem, agradável, natural e fiel. Guarda-te de dobrez,
artifícios e toda sorte de dissimulações, porque,embora não seja prudente dizer
sempre a verdade, entretanto, é sempre ilícito faltar a verdade. Acostuma-se a
nunca mentir, nem de propósito, nem por desculpa nem doutra forma qualquer,
lembrando-te que Deus é o Deus da verdade.
E,
se alguma mentira te escapar descuido e a podes reparar por uma explicação ou
de algum outro modo, faze-o prontamente. Uma escusa verdadeira tem muito maior
graça e eficácia, para justificar, que uma mentira meditada.
Conquanto,
se possa às vezes disfarçar e encobrir a verdade por algum artifício de
palavras, só o devemos fazer nas coisas importantes quando a glória e o serviço
de Deus o exigem manifestamente; fora disso são estes artifícios muito
perigosos, tanto assim que diz a Sagrada Escritura que o Espírito Santo não habita num
espírito dissimulado e duplo.
Nunca
existiu sutileza maior e mais estimável que a simplicidade. A prudência mundana
com todos os seus artifícios é o sinal dos filhos do século; os filhos de Deus
andam por um caminho reto e tem o coração sem dobras. Quem caminha com
simplicidade diz o sábio, caminha com confiança. A mentira, a dobrez, a
dissimulação serão sempre tendências naturais de um espírito vil e fraco.
Santo
Agostinho tinha dito no quarto livro de suas confissões que sua alma e a de seu
amigo eram unidas numa só alma, que esta vida lhe era insuportável depois do seu
falecimento, porque não queria viver assim só pela metade, mas que por esta
mesma razão não queria morrer, com medo que seu amigo morresse completamente.
Mais
tarde estas palavras lhe pareceram demasiadas afetadas e no seu livro das
retratações ele censurou, chamando-as de inépcias.
Eis
aí, Filotéia, que delicadeza desta alma santa e bela, quanta a afetação nas
palavra!A fidelidade, sinceridade e a naturalidade da linguagem é certamente um
lindo ornato da vida cristã. Disse e o farei, protestava Davi, guardarei
os meus caminhos para não pecar com minha língua. Põe Senhor, guardas a minha
boca e aos meus lábios uma porta que os feche.
Aconselhava
o Rei São Luís nunca contradizer a ninguém senão em caso de pecado ou de algum
grave dano, para evitar as contendas. E quando for necessário contradizer aos
outros e opor a própria opinião à sua,
isto deve ser feito com muita doçura e jeito, para não parecer que se lhes quer
fazer violência; tanto mais que com aspereza pouco ou nada se consegue.
A
regra de falar pouco, que os antigos sábios tanto recomendavam não se toma no
sentido de dizer poucas palavras, mas no não dizer muitas inúteis, não quanto à
quantidade, mas, quanto à qualidade. Dois extremos me parece que devem ser evitados
cuidadosamente.
O
primeiro consiste em assumir, nas conversas de que se participa um ar orgulhoso
e austero, dum silencio afetado, manifestando desconfiança e desprezo.
O
segundo consiste em falar demais, sem deixar ao interlocutor nem tempo nem ocasião
de dizer algumas palavras, o que deixa transparecer um espírito presunçoso e
leviano.
São
Luís não tinha por bem falar-se numa reunião em segredo ou, como então se
dizia, “em conselho”, particularmente a mesa, com receio de que os outros
pensassem que se estava falando mal deles.
Sim - dizia ele - se a mesa ou numa reunião se tem alguma coisa boa ou
interessante para dizer, diga-se alto e para todos; tratando-se, porém, duma
coisa séria e importante não se fale sobre isso com ninguém.
Da Obra Filotea