SÓ DEUS BASTA!
Teresa de Cepeda e Ahumada nasceu na província de Ávila, Espanha,
numa família da baixa nobreza. Seus pais chamavam-se Alonso Sánchez de Cepeda e
Beatriz Dávila e Ahumada. Teresa refere-se a eles com muito carinho. Alonso
teve três filhos de seu primeiro casamento. Beatriz deu-lhe outros nove.
Aos sete anos, gostava muito de ler histórias dos santos. Seu irmão
Rodrigo tinha quase a sua idade, por isto costumavam brincar juntos. As duas
crianças viviam pensando na eternidade, admiravam a coragem dos santos na
conquista da glória eterna. Achavam que os mártires tinham alcançado a glória
muito facilmente e decidiram partir para o país dos mouros com
a esperança de morrer pela fé. Assim sendo, fugiram de casa, pedindo a Deus que lhes
permitisse dar a vida por Cristo. EmAdaja encontraram um dos tios que os
devolveu aos braços da aflita mãe. Quando esta os repreendeu, Rodrigo colocou
toda a culpa na irmã. Com o fracasso de seus planos, Teresa e Rodrigo decidiram
viver como ermitães na própria casa e construíram uma cela no jardim, sem nunca
conseguir terminá-la. Desde então, Teresa amava a solidão.
Juventude
A mãe de Teresa faleceu quando esta tinha quatorze anos: "Quando
me dei conta da perda que sofrera, comecei a entristecer-me. Então me dirigi a
uma imagem de Nossa Senhora e supliquei com muitas lágrimas que me tomasse como
sua filha". Quando completou quinze anos, o pai levou-a a estudar no Convento das
Agostinianas de Ávila, para onde iam as jovens de sua classe social.
Um ano e meio mais tarde, Teresa adoeceu e seu pai a levou para casa. A
jovem começou a pensar seriamente na vida
religiosa que a atraía por um lado e a repugnava por outro. O
que a ajudou na decisão foi a leitura das "Cartas" de São Jerônimo, cujo fervoroso realismo encontrou
eco na alma de Teresa. A jovem comunica ao pai que desejava tornar-se
religiosa, mas este pediu-lhe para esperar que ele morresse para ingressar no
convento. No entanto, em uma madrugada, com 20 anos, a santa fugiu para o Convento
Carmelita de Encarnación, em Ávila, com a intenção de não voltar para casa.
Vida
religiosa
Teresa ficou no Convento da Encarnação. Tinha 20 anos. Seu pai, ao vê-la
tão decidida, deixou de opor-se à sua vocação. Um ano depois fez a profissão
dos votos. Pouco depois, piorou de uma enfermidade que começara a molestá-la
antes de professar. Seu pai a retirou do convento. A irmã Joana Suárez
acompanhou Teresa para ajudá-la. Os médicos, apesar de todos os tratamentos,
deram-se por vencidos e a enfermidade, provavelmente impaludismo (malária), se
agravou. Teresa conseguiu suportar aquele sofrimento, graças a um livrinho que
lhe fora dado de presente por seu tio Pedro: "O terceiro alfabeto
espiritual", do Padre Francisco de Osuna. Teresa seguiu as instruções
da pequena obra e começou a praticar a oração mental. Finalmente, após três
anos, ela recuperou a saúde e retornou ao Carmelo.
Sua prudência, amabilidade e caridade conquistavam a todos. Segundo o
costume dos conventos espanhóis da época, as religiosas podiam receber todos os
visitantes que desejassem, a qualquer hora. Teresa passava grande parte de seu
tempo conversando no locutório. Isto a levou a descuidar-se da oração mental.
Vivia desculpando-se dizendo que suas enfermidades a impediam de meditar.
Pouco depois da morte de seu pai, o confessor de Teresa fê-la ver o
perigo em que se achava sua alma e aconselhou-a a voltar à prática da oração.
Desde então, a santa jamais a abandonou. No entanto, ainda não se decidira a
entregar-se totalmente a Deus nem a renunciar totalmente às horas que passava
no locutório trocando conversas e presentes com os visitantes. Curioso notar
que, em todos estes anos de indecisão no serviço de Deus, Santa Teresa jamais
se cansava de prestar atenção aos sermões, "por piores que fossem".
Cada vez mais convencida de sua indignidade, Teresa invocava com
freqüência os grandes santos penitentes, Santo
Agostinho eSanta Maria Madalena, aos quais estão
associados dois fatos que foram decisivos na vida da santa. O primeiro foi a
leitura das "Confissões" de Santo
Agostinho. O segundo foi um chamamento à penitência que ela
experimentou diante de um quadro da Paixão do Senhor: "Senti que Santa Maria Madalena vinha em meu
socorro... e desde então muito progredi na vida espiritual". Sentia-se
muito atraída pelas imagens de Cristo ensangüentado em agonia. Certa ocasião,
ao deter-se sob um crucifixo muito ensanguentado, perguntou: "Senhor,
quem vos colocou aí?" Pareceu-lhe ouvir uma voz: "Foram tuas
conversas no parlatório que me puseram aqui, Teresa". Ela chorou muito
e a partir de então não voltou a perder tempo com conversas inúteis e nas
amizades que não a levavam à santidade.
As Carmelitas, como a maioria das religiosas, desde os princípios
do século XVI, já haviam perdido o primeiro
fervor. Já vimos que os locutórios dos conventos de Ávila eram uma espécie de
centro de reunião para damas e cavalheiros de toda a cidade. As religiosas
saíam da clausura pelo menor pretexto. Os conventos eram lugares ideais para
quem desejava uma vida fácil e sem problemas. As comunidades eram muito
numerosas. O Convento da Encarnação possuía quase 200 religiosas.
Só o amor dá valor a todas as coisas. E o mais
necessário é que seja grande o bastante para que nenhuma coisa o estorve.
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Reformadora
e fundadora
Já que esta situação era aceite como normal, as religiosas não se davam
conta de que o seu modo de vida estava muito distante do espírito de seus
fundadores. Assim, quando uma sobrinha de Santa Teresa, também religiosa no
Convento da Encarnação, lhe deu a ideia de fundar uma comunidade reduzida, a
santa, que já estava há 25 anos naquele convento, resolveu colocar em prática o
plano.
São Pedro de Alcântara, São Luís Beltrán e o
bispo de Ávila aprovaram o projeto. O provincial
dos Carmelitas,
Pe. Gregório Fernández, autorizou Teresa a colocar seu plano em prática.
Contudo, a execução do projeto causou muitos comentários e o provincial retirou
a permissão. Santa Teresa foi criticada pelos nobres, pelos magistrados, pelo
povo e até por suas próprias irmãs. Apesar disso tudo, o dominicano Pe. Ibañez incentivou
Teresa a prosseguir seu projeto.
São Pedro de Alcântara, Dom Francisco de Salcedo e
o Pe. Gaspar Daza conseguiram
que o bispo tomasse a causa da fundação do novo convento para si. Eis que chega
de Roma a autorização para se criar a nova casa religiosa, o que ocorreu no dia
de São Bartolomeu, em 1562. Durante a missa
receberam o véu a sobrinha da santa e outras três noviças.
A inauguração causou grande rebuliço em Ávila. Nesta mesma tarde, a superiora do
Convento da Encarnação mandou chamar Teresa e a santa a procurou com certo temor,
pensando que iam encarcerá-la. Teve que explicar sua conduta à superiora e ao
Pe. Angel de Salazar,
provincial da Ordem. A Santa reconhece que não faltava razão a seus superiores
por estarem desgostosos. Mesmo assim, o Pe. Salazar lhe prometeu que ela
poderia retornar ao Convento de São José logo
que se acalmassem os ânimos da população.
A fundação não era bem vista em Ávila, porque as pessoas desconfiavam das
novidades e temiam que um convento sem recursos se transformasse em um peso
para a cidade. O prefeito e os magistrados teriam mandado demolir o convento,
se não tivessem sido dissuadidos pelo dominicano Bañez. Santa Teresa não
perdeu a paz em meio às perseguições e prosseguiu colocando a obra nas mãos de Deus.
Francisco de Salcedo e outros partidários da fundação enviaram à corte
um sacerdote que defendesse a causa diante do rei. Os doisdominicanos Báñez e Ibáñez acalmaram
o bispo e o provincial. Pouco a pouco a tempestade foi-se acalmando. Quatro
meses depois, o Pe. Salazar permitiu que Santa Teresa e suas quatro religiosas
retornassem ao Convento de São José.
Teresa estabeleceu em seu convento a mais estrita clausura e o silêncio
quase perpétuo. A comunidade vivia na maior pobreza. As religiosas vestiam
hábitos toscos, usavam sandálias em vez de sapatos (por isso foram chamadas
"descalças") e eram obrigadas a abstinência perpétua de carne.
A fundadora, a princípio, não aceitou comunidades com mais de treze religiosas.
Mais tarde, nos conventos que possuiam alguma renda, aceitou que residissem
vinte monjas.
A grande mística Teresa não descuidava das coisas práticas. Sabia
utilizar as coisas materiais para o serviço de Deus. Certa ocasião disse:
"Teresa sem a graça de Deus é uma pobre mulher; com a graça de Deus, uma fortaleza; com a
graça de Deus e
muito dinheiro, uma potência".
Encontrou certo dia em Medina del
Campo dois frades carmelitas que
estavam dispostos a abraçar a Reforma: Antonio de Jesús de Heredia, superior, e
Juan de Yepes, que seria o futuro São João da Cruz.
Aproveitando a primeira oportunidade, ela fundou um conventinho de
frades em Duruelo em 1568. Em 1569 fundou o de Pastrana.
Em ambos reinava a maior pobreza e austeridade. Santa Teresa deixou o resto das
fundações de conventos de frades a cargo de São João da Cruz. Depois de muitas lutas,
incompreensões e perseguições, obteve de Roma uma ordem que eximia os Carmelitas Descalços da jurisdição do
Provincial dos Calçados.
Em 1580,
quando estabeleceu-se a separação entre os dois ramos da Ordem do
Carmo, Santa Teresa de Ávila tinha 65 anos e sua saúde estava muito
debilitada. Nos últimos anos de sua vida fundou outros dois conventos. As
fundações da Santa não eram simplesmente um refúgio das almas contemplativas,
mas também uma espécie de reparação pelos destroços causados nos mosteiros pelo protestantismo,
principalmente na Inglaterra e na Alemanha.
A
morte
Na fundação do convento de Burgos, que foi
a última, as dificuldades não diminuiram. Em julho de 1582, quando o convento já
ia com suas obras adiantadas, Santa Teresa tinha intenção de retornar a Ávila, mas viu-se forçada a mudar seus planos
para ir a Alba de Tormes visitar a duquesa Maria
Henríquez. A Beata Ana de São Bartolomeu afirmou
que a viagem não estava bem programada e que a Santa estava tão fraca que
desmaiou no caminho. Certa noite só puderam comer alguns figos. Chegando a
Alba, Teresa teve que deitar-se imediatamente. Três dias depois, disse à Beata
Ana de São Bartolomeu: "Finalmente, minha filha, chegou a hora de minha
morte". O Pe. Antonio de Heredia ministrou-lhe
os últimos sacramentos. Quando o mesmo padre levou-lhe o viático,
a Santa conseguiu erguer-se do leito e exclamou: "Oh, Senhor, por fim
chegou a hora de nos vermos face a face!" Ela morreu às 9 horas da
noite de 4 de outubro de 1582. Exatamente no dia
seguinte efetuou-se a Mudança para o calendário gregoriano,
que suprimiu dez dias, de modo que a festa da santa foi fixada, mais tarde,
para o dia 15 de outubro. Foi sepultada em Alba de
Tormes, onde repousam suas relíquias.
Teresa é uma das maiores personalidades da mística católica de todos os
tempos. Suas obras, especialmente as mais conhecidas (Livro da Vida, Caminho de
Perfeição, Moradas e Fundações), contém uma doutrina que abraça toda a vida da
alma, desde os primeiros passos até à intimidade com Deus no centro do
Castelo Interior. Suas cartas no-la mostram absorvida com os problemas mais
triviais. Sua doutrina sobre a união da alma com Deus é bem firmada na
trilha da espiritualidade carmelita, que ela tão notavelmente soube enriquecer
e transmitir, não apenas a seus irmãos, filhos e filhas espirituais, mas à toda
Igreja, à qual serviu fiel e generosamente. Ao morrer sua alegria foi poder
afirmar: "Morro como filha da Igreja".
Foi canonizada em 1622. No dia 27 de setembro de 1970, o Papa Paulo VI conferiu-lhe
o título de Doutora da Igreja.
Santa Teresa de Ávila é considerada um dos maiores gênios que a
humanidade já produziu. Mesmo ateus e livres-pensadores são obrigados a
enaltecer sua viva e arguta inteligência, a força persuasiva de seus
argumentos, seu estilo vivo e atraente e seu profundo bom senso. O grande
Doutor da Igreja, Santo Afonso Maria de Ligório, a tinha em
tão alta estima que a escolheu como patrona, e a ela consagrou-se como filho
espiritual, enaltecendo-a em muitos de seus escritos.
Sua festa é comemorada no dia 15 de outubro.