sexta-feira, 31 de maio de 2013

FESTA DA VISITAÇÃO DA SANTÍSSIMA VIRGEM MARIA


São Francisco de Sales teve a inspiração de dedicar o Instituto que havia fundado a Santíssima Virgem Maria no Mistério da Visitação. Escolheu-o por ser um mistério oculto, em que encontrava muitas luzes para o espírito que o devia animar.

Nossa amável e insuficientemente amada Senhora e mestra, a gloriosa Virgem, enquanto deu seu consentimento as palavras do arcanjo São Gabriel, o mistério da Encarnação se realizou nela. E sabendo pelo mesmo São Gabriel que sua prima Isabel havia concebido um filho em sua velhice, quis ir vê-la desejando servi-la e ajuda-la, porque sabia que isto era da vontade de Deus; com prontidão saiu de Nazaré, pequena cidade da Galileia para ir a Judeia a casa de Zacarias. Empreendeu a viagem longa e difícil subindo a montanha da Judeia, um caminho muito pesado para esta terna e delicada Virgem.

O que impulsionou particularmente a nossa gloriosa Mestra a fazer esta visita foi sua ardente caridade e sua profunda humildade; sim, minhas queridas Irmãs, estas duas virtudes a fizeram deixar Nazaré, por que a caridade não é ociosa, senão que arde nos corações em que habita e reina, a Santíssima Virgem estava plena dela, pois que levava o Amor mesmo em suas entranhas. Ela tinha contínuos atos de amor, não somente com Deus com o qual estava unida pela mais perfeita dileção, senão que tinha o amor do próximo em grande perfeição, que a fazia desejar ardentemente a salvação das almas.

Nossa Senhora se alegra com sua prima; elas são impulsionadas a glorificar a Deus que havia derramado tantas graças: sobre ela, que era virgem, fazendo-a conceber o Filho de Deus por obra do Espírito Santo, e sobre Santa Isabel que era estéril, concebendo milagrosamente e por graça especial a aquele que devia ser o precursor do Messias.

Com a caridade, a Santíssima Virgem havia recebido uma profunda humildade, como a manifesta a que responde ao louvor de Isabel: “Porque Deus olhou para a humildade de sua serva, doravante as gerações me chamarão bem-aventurada” (Lc 1.48).

Ao dizer humilde ela não se referia a virtude da humildade senão a própria condição que via em si mesma, ao que era por natureza e do nada que havia saído. Nosso Senhor deu testemunho da humildade de sua mãe, quando a louvando chama “mulher”, Ele manifesta que é feliz porque o tem levado em seu ventre, porém, pela humildade com que ela diz “sim” a vontade do Pai celestial e a ter cumprido.

O evangelista disse que a Virgem se levantou apressada para mostrar sua prontidão com a que se devem seguir as inspirações divinas; porque é próprio do Espírito Santo, quando toca um coração, inquietá-lo; Ele ama a diligência e a prontidão; é inimigo de prazos e atrasos na execução do que é a vontade de Deus.
Minhas queridas Irmãs, como devem estar cheias de alegria quando são visitadas por este Divino Salvador no Santíssimo Sacramento do altar, e pelas graças interiores que diariamente recebem de sua Divina Majestade, por tantas inspirações e palavras que Ele fala a seus corações; porque Ele está sempre indicando o que quer que façam por seu amor.

Quantas ações de graças devem dar ao senhor por tantos favores! Como devem escutá-lo com grande atenção e realizar fiel e prontamente suas divinas vontades!
A Santíssima Virgem escutando os louvores de sua prima Isabel se humilhava e por tudo glorificava a Deus, confessando que toda a sua felicidade procedia de que Ele havia olhado a humildade de sua serva e entoa o formoso e admirável canto do “Magnificat”, que supera todos cantados por outras mulheres que a Sagrada Escritura menciona.

Oh minhas queridas Irmãs, quem tem esta Virgem por Mãe, Filhas da Visitação de Nossa Senhora a Santa Isabel, devem ter um grande cuidado em imitá-la, sobretudo na sua humildade e caridade, que são as principais virtudes que a motivaram fazer esta visita; portanto devem ter uma grande diligência e alegria para visitar suas Irmãs enfermas, aliviando-as e servindo-as cordialmente em suas enfermidades, espirituais e corporais; e para tudo o que se refere a praticar a humildade e a caridade deve por especial cuidado e prontidão; porque para ser Filha de Nossa Senhora não basta estar nas casas da Visitação e levar o véu de Religiosa. Seria cometer uma ofensa a esta Mãe, contentando-se com isto.

É necessário imitá-la em sua santidade e virtudes; portanto, minhas queridas Irmãs, sejam cuidadosas em conformar suas vidas com a dela; sejam doces, humildes, caridosas e bondosas; com ela glorifiquem o Senhor nesta vida. Que se o fazem fiel e humildemente neste mundo, indubitavelmente que no céu cantarão com Ela, “Magnificat”; e bendizendo com este cântico a Divina Majestade, serão abençoadas por Ela durante toda a eternidade, conduzindo-nos a Santíssima Trindade.

Extraído do sermão de São Francisco de Sales para a festa da Visitação, 1618.


sexta-feira, 24 de maio de 2013

24 de maio: FESTA DE MARIA, AUXILIADORA DOS CRISTÃOS



Esta invocação mariana encontra suas raízes no ano 1571, quando Selim I, imperador dos turcos, após conquistar várias ilhas do Mediterrâneo, lança seu olhar de cobiça sobre toda a Europa. O Papa Pio V, diante da inércia das nações cristãs, resolveu organizar uma poderosa esquadra para salvar os cristãos da escravidão muçulmana. Para tanto, invocou o auxílio da Virgem Maria para este combate católico.
A vitória aconteceu no dia 7 de outubro de 1571. Afastada a perseguição maometana, o Santo Padre demonstrou sua gratidão à Virgem acrescentando nas ladainhas loretanas a invocação: Auxiliadora dos Cristãos. 

No entanto, a festa de Nossa Senhora Auxiliadora só foi instituída em 1816, pelo Papa Pio VII, a fim de perpetuar mais um fato que atesta a intercessão da Santa Mãe de Deus: Napoleão I, empenhado em dominar os estados pontifícios, foi excomungado pelo Sumo Pontífice. Em resposta, o imperador francês seqüestrou o Vigário de Cristo, levando-o para a França. Movido por ardente fé na vitória, o Papa recorreu à intercessão de Maria Santíssima, prometendo coroar solenemente a imagem de Nossa Senhora de Savona logo que fosse liberto.

O Santo Padre ficou cativo por cinco anos, sofrendo toda espécie de humilhações. Uma vez fracassado, Napoleão cedeu à opinião pública e libertou o Papa, que voltou a Savona para cumprir sua promessa. No dia 24 de maio de 1814, Pio VII entrou solenemente em Roma, recuperando seu poder pastoral. Os bens eclesiásticos foram restituídos. Napoleão viu-se obrigado a assinar a abdicação no mesmo palácio onde aprisionara o velho pontífice.

Para marcar seu agradecimento à Santa Mãe de Deus, o Papa Pio VII criou a festa de Nossa Senhora Auxiliadora, fixando-a no dia de sua entrada triunfal em Roma.
O grande apóstolo da juventude, São João Bosco, adotou esta invocação para sua Congregação Salesiana porque ele viveu numa época de luta entre o poder civil e o eclesiástico. A fundação de sua família religiosa, que difunde pelo mundo o amor a Nossa Senhora Auxiliadora, deu-se sob o ministério do Conde Cavour, no auge dos ódios políticos e religiosos que culminaram na queda de Roma e destruição do poder temporal da Igreja. Nossa Senhora foi colocada à frente da obra educacional de Dom Bosco para defendê-la em todas as dificuldades. 

No ano de 1862, as aparições de Maria Auxiliadora na cidade de Spoleto marcam um despertar mariano na piedade popular italiana. Nesse mesmo ano, São João Bosco iniciou a construção, em Turim, de um santuário, que foi dedicado a Nossa Senhora, Auxílio dos Cristãos.

São João Bosco ensinou aos membros da família Salesiana a amarem Nossa Senhora, invocando-a com o título de AUXILIADORA. Pode-se afirmar que a invocação de Maria como título de Auxiliadora teve um impulso enorme com Dom Bosco. Ficou tão conhecido o amor do Santo pela Virgem Auxiliadora a ponto de Ela ser conhecida também como a "Virgem de Dom Bosco".
Escreveu Dom Bosco: "A festa de Maria Auxiliadora deve ser o prelúdio da festa eterna que deveremos celebrar todos juntos um dia no Paraíso".


domingo, 19 de maio de 2013

HOMILIA DO SANTO PADRE FRANCISCO


Praça de São Pedro
Domingo, 19 de Maio de 2013
 
Amados irmãos e irmãs,

Neste dia, contemplamos e revivemos na liturgia a efusão do Espírito Santo realizada por Cristo ressuscitado sobre a sua Igreja; um evento de graça que encheu o Cenáculo de Jerusalém para se estender ao mundo inteiro.

Então que aconteceu naquele dia tão distante de nós e, ao mesmo tempo, tão perto que alcança o íntimo do nosso coração? São Lucas dá-nos a resposta na passagem dos Actos dos Apóstolosque ouvimos (2, 1-11). O evangelista leva-nos a Jerusalém, ao andar superior da casa onde se reuniram os Apóstolos. A primeira coisa que chama a nossa atenção é o rombo improviso que vem do céu, «comparável ao de forte rajada de vento», e enche a casa; depois, as «línguas à maneira de fogo» que se iam dividindo e pousavam sobre cada um dos Apóstolos. Rombo e línguas de fogo são sinais claros e concretos, que tocam os Apóstolos não só externamente mas também no seu íntimo: na mente e no coração. Em consequência, «todos ficaram cheios do Espírito Santo», que esparge seu dinamismo irresistível com efeitos surpreendentes: «começaram a falar outras línguas, conforme o Espírito lhes inspirava que se exprimissem». Abre-se então diante de nós um cenário totalmente inesperado: acorre uma grande multidão e fica muito admirada, porque cada qual ouve os Apóstolos a falarem na própria língua. É uma coisa nova, experimentada por todos e que nunca tinha sucedido antes: «Ouvimo-los falar nas nossas línguas». E de que falam? «Das grandes obras de Deus».

À luz deste texto dos Actos, quereria reflectir sobre três palavras relacionadas com a acção do Espírito: novidade, harmonia e missão.

1. A novidade causa sempre um pouco de medo, porque nos sentimos mais seguros se temos tudo sob controle, se somos nós a construir, programar, projectar a nossa vida de acordo com os nossos esquemas, as nossas seguranças, os nossos gostos. E isto verifica-se também quando se trata de Deus. Muitas vezes seguimo-Lo e acolhemo-Lo, mas até um certo ponto; sentimos dificuldade em abandonar-nos a Ele com plena confiança, deixando que o Espírito Santo seja a alma, o guia da nossa vida, em todas as decisões; temos medo que Deus nos faça seguir novas estradas, faça sair do nosso horizonte frequentemente limitado, fechado, egoísta, para nos abrir aos seus horizontes. Mas, em toda a história da salvação, quando Deus Se revela traz novidade – Deus traz sempre novidade - , transforma e pede para confiar totalmente n’Ele: Noé construiu uma arca, no meio da zombaria dos demais, e salva-se; Abraão deixa a sua terra, tendo na mão apenas uma promessa; Moisés enfrenta o poder do Faraó e guia o povo para a liberdade; os Apóstolos, antes temerosos e trancados no Cenáculo, saem corajosamente para anunciar o Evangelho. Não se trata de seguir a novidade pela novidade, a busca de coisas novas para se vencer o tédio, como sucede muitas vezes no nosso tempo. A novidade que Deus traz à nossa vida é verdadeiramente o que nos realiza, o que nos dá a verdadeira alegria, a verdadeira serenidade, porque Deus nos ama e quer apenas o nosso bem. Perguntemo-nos hoje a nós mesmos: Permanecemos abertos às «surpresas de Deus»? Ou fechamo-nos, com medo, à novidade do Espírito Santo? Mostramo-nos corajosos para seguir as novas estradas que a novidade de Deus nos oferece, ou pomo-nos à defesa fechando-nos em estruturas caducas que perderam a capacidade de acolhimento? Far-nos-á bem pormo-nos estas perguntas durante todo o dia.

2. Segundo pensamento: à primeira vista o Espírito Santo parece criar desordem na Igreja, porque traz a diversidade dos carismas, dos dons. Mas não; sob a sua acção, tudo isso é uma grande riqueza, porque o Espírito Santo é o Espírito de unidade, que não significa uniformidade, mas a recondução do todo à harmonia. Quem faz a harmonia na Igreja é o Espírito Santo. Um dos Padres da Igreja usa uma expressão de que gosto muito: o Espírito Santo «ipse harmonia est – Ele próprio é a harmonia». Só Ele pode suscitar a diversidade, a pluralidade, a multiplicidade e, ao mesmo tempo, realizar a unidade. Também aqui, quando somos nós a querer fazer a diversidade fechando-nos nos nossos particularismos, nos nossos exclusivismos, trazemos a divisão; e quando somos nós a querer fazer a unidade segundo os nossos desígnios humanos, acabamos por trazer a uniformidade, a homogeneização. Se, pelo contrário, nos deixamos guiar pelo Espírito, a riqueza, a variedade, a diversidade nunca dão origem ao conflito, porque Ele nos impele a viver a variedade na comunhão da Igreja. O caminhar juntos na Igreja, guiados pelos Pastores – que para isso têm um carisma e ministério especial – é sinal da acção do Espírito Santo; uma característica fundamental para cada cristão, cada comunidade, cada movimento é a eclesialidade. É a Igreja que me traz Cristo e me leva a Cristo; os caminhos paralelos são muito perigosos! Quando alguém se aventura ultrapassando (proagon) a doutrina e a Comunidade eclesial – diz o apóstolo João na sua Segunda Carta - e deixa de permanecer nelas, não está unido ao Deus de Jesus Cristo (cf. 2 Jo 1, 9). Por isso perguntemo-nos: Estou aberto à harmonia do Espírito Santo, superando todo o exclusivismo? Deixo-me guiar por Ele, vivendo na Igreja e com a Igreja?

3. O último ponto. Diziam os teólogos antigos: a alma é uma espécie de barca à vela; o Espírito Santo é o vento que sopra na vela, impelindo-a para a frente; os impulsos e incentivos do vento são os dons do Espírito. Sem o seu incentivo, sem a sua graça, não vamos para a frente. O Espírito Santo faz-nos entrar no mistério do Deus vivo e salva-nos do perigo de uma Igreja gnóstica e de uma Igreja narcisista, fechada no seu recinto; impele-nos a abrir as portas e sair para anunciar e testemunhar a vida boa do Evangelho, para comunicar a alegria da fé, do encontro com Cristo. O Espírito Santo é a alma da missão. O sucedido em Jerusalém, há quase dois mil anos, não é um facto distante de nós, mas um facto que nos alcança e se torna experiência viva em cada um de nós. O Pentecostes do Cenáculo de Jerusalém é o início, um início que se prolonga. O Espírito Santo é o dom por excelência de Cristo ressuscitado aos seus Apóstolos, mas Ele quer que chegue a todos. Como ouvimos no Evangelho, Jesus diz: «Eu apelarei ao Pai e Ele vos dará outro Paráclito para que esteja sempre convosco» (Jo 14, 16). É o Espírito Paráclito, o «Consolador», que dá a coragem de levar o Evangelho pelas estradas do mundo! O Espírito Santo ergue o nosso olhar para o horizonte e impele-nos para as periferias da existência a fim de anunciar a vida de Jesus Cristo. Perguntemo-nos, se tendemos a fechar-nos em nós mesmos, no nosso grupo, ou se deixamos que o Espírito Santo nos abra à missão. Recordemos hoje estas três palavras: novidade, harmonia, missão.

A liturgia de hoje é uma grande súplica, que a Igreja com Jesus eleva ao Pai, para que renove a efusão do Espírito Santo. Cada um de nós, cada grupo, cada movimento, na harmonia da Igreja, se dirija ao Pai pedindo este dom. Também hoje, como no dia do seu nascimento, a Igreja invoca juntamente com Maria: «Veni Sancte Spiritus… – Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor»! Amen.


quarta-feira, 15 de maio de 2013

A VIA PURGATIVA EM SÃO JOÃO DA CRUZ

Izaias  da Silva
Seminário Maria Mater Ecclesiae do Brasil




Para compreender a via purgativa de São João da Cruz, ou seja, essa via inicial da alma; um caminho de purificação dos sentidos, dos maus desejos, das vontades que nos levam a nos afastar do nosso principio original; que é a imagem e semelhança de Deus. Não se pode deixar de lado um pouco de sua história marcada pela dor e sofrimento.

Ao adentrar no inesperado da fé que conduz cada homem a experimentar o grande e misterioso poder de Deus que não tritura o homem, mas com um amor e delicadeza vai norteando o homem à verdadeira liberdade. “São João da Cruz é um místico amadurecido no sol do sofrimento, provado por Deus através de noites da fé; não compreendido pelos homens” (1). De fato, um caminho de luta para alcançar a perfeição, de um processo a se assemelhar com Cristo sempre foi e será incompreensível aos olhos humanos. Mas, que cada um trás a impressão da experiência. Assim, não se deixa subjugar-se pelas propostas ou aterroriza-se pelo futuro que muitas vezes nos trás a dor e o sofrimento. São João da Cruz conheceu uma infância marcada pela pobreza e miséria. Os seus pés descalços, suas roupas remendadas e, algumas vezes, o grande silêncio da fome levava-o bem cedo a uma cruel realidade da vida. “Uma existência breve (49 anos), aparentemente pobre de acontecimentos que podem suscitar curiosidade ou chamar atenção... É na monotonia da vida, nas feridas abertas pelas incompreensões, que desabrocha a santidade do primeiro Carmelita Descalço, severo e exigente consigo mesmo, terno e delicado com os que o circundam” (2).

          Tudo o que São João da Cruz passou, sofreu; não lhe causou nenhum complexo de inferioridade, apesar dos sofrimentos, uma vida mesquinha, uma vida marcada até mesmo pela fome, mas que soube unir todo o seu sofrimento ao sofrimento de Cristo, apreendeu por meio das dores a amar a Cristo. “João sempre viveu a pobreza, a fome e a humilhação sob o exemplo da família, cristãmente. Inteligente e atento como ele era, não precisou de muitas palavras para compreender que a existência, diante, da eternidade, era, como mais tarde diria Teresa de Ávila, uma noite passada em má hospedaria. Lera isto, muito cedo, nos olhos úmidos de sua mãe, quando, na igreja paroquial de Fortiveros, via-a diante do Crucificado, na mesma atitude de Nossa Senhora aos pés da cruz”(3).
          
Os fatos e acontecimentos da vida desse grande Santo, nós percebemos o desapego das coisas do mundo e de si mesmo, pra ele essa vida era puramente passageira e sem sentido; que encontrará o sentido de todo o seu sofrimento na cruz de Cristo, que sofreu para dar o céu a todos. Deus sempre usa das coisas mundanas para transformar o homem, pois, Ele tendo usado de toda a história para transformar no jovem João em um homem completamente maduro voltado para os tesouros eternos e que duram para sempre. Tendo em mente em servir somente a Deus, não podendo servir aos tesouros do mundo que são passageiros, de fato, não deve misturar os tesouros incorruptíveis dos céus com os tesouros corruptíveis do mundo.

          “Para explicar e fazer compreender a noite escura pela qual passa a alma, antes de chegar à divina luz da perfeita união do amor de Deus, na medida do possível neste mundo, seria necessário outra maior luz de experiência e de ciência do que a minha. As ditosas almas destinadas a chegar a este estado de perfeição devem, de ordinário, afrontar trevas tão profundas, suportar sofrimentos físicos e morais tão dolorosos, que a inteligência humana é incapaz de compreendê-los e a palavra de exprimi-los. Somente aquele que por isso passa saberá senti-lo, sem, todavia, poder defini-lo”(4). De modo que, a alma passa por labirintos da vida completamente escuros, muitas vezes sem sentido e sem esperança, contudo, purgará a sua alma através dos sofrimentos, o desapego das coisas mundanas, a acima de tudo o desapego de si mesmo, este é o mais difícil; o que mais custa. Chegando ao ponto de esquecer-se de si mesmo e viver completamente para Deus e para o próximo. Imitar Jesus Cristo para encontrar-se com Deus Pai.

            Essa primeira via; uma purificação da alma que a conduz a uma união com Deus, contudo, deve renunciar a tudo que possui, a todos os apegos, privando-a de todos os apetites, das coisas mundanas. Com certeza, constitui uma noite escura para alma, um tormento e como isso dói. Isso custa muito para a alma que quer caminhar por uma via que leva a uma união com Deus. Oh! Se soubessem as almas inferiores à abundância de graças e de bens espirituais de que se privam, recusando desapegar-se inteiramente do desejo das ninharias deste mundo(5).

É a etapa inicial da alma, trata-se do momento da conversão, onde se exige mais trabalho e cooperação de nossa parte com a graça de Deus. Onde a alma ordena as suas cinco potencias para Deus, que são os seus cinco sentidos.
O cristão nessa etapa passa por um processo de purificação dos sentidos, do entendimento e da vontade. Chegando a uma desnudes espiritual. Renunciando a tudo para alcançar a plenitude em Deus. Afasta-se em primeiro lugar do pecado na sua vida, seja ele mortal ou venial.

         Os meios com que ele usa para chegar à união com Deus são: a purificação dos sentidos, a renunciar todos os gostos desta terra, para chegar a desnudes espiritual por meio da oração discursiva, da vida sacramental, principalmente da Eucaristia, da confissão, da penitência e mortificação dos sentidos. É uma etapa onde a alma começa a desprender-se do que lhe separa de Deus, de si mesmo, é um momento de conversão de um esvaziamento total de si, para que Deus possa preencher este espaço vazio.

          Contudo, é preciso desapegar-se, pois, uma alma que é incapaz de desapegar-se das coisas mundanas, nunca chegará à união com Deus, nunca experimentará o amor de Deus, todavia, ficará eternamente dependente e preza aos prazeres terrenos; como fez o homem rico no Evangelho de São Marcos; contristado com essa palavra saiu pesaroso, pois era possuidor de muitos bens.  É preciso que a alma passe por um processo de mortalidade, é necessário que ela se mortifique das coisas que apartará de Deus. A alma ao se entregar completamente a Deus desapega-se de tudo, vivendo assim, completamente para Deus, tendo um crescimento espiritual. A ama passa por várias etapas da vida para alcançar a etapa final, ou seja, união com o Deus. “Durante a ascensão desta montanha, é necessário reprimir e mortificar, com cuidado incessante, todos os apetites. E tanto mais depressa chagará a seu fim, quanto mais rapidamente isto fizer. Se assim não for, jamais subirá ao cume, por mais virtudes que pratique, pois não as exercita com a perfeição que consiste em ter a alma vazia, nua e purificada de todo o apetite” (6).


            Mas isso leva tempo, é um processo e um caminhar durante toda a vida de cada um; uma luta diária. Uma purificação da alma deve ir matando aquilo que nos afasta de Deus e encaminhando-a a Deus. É impossível ter uma vida santa, uma vida unida a Deus sem se converter, sem mudar de vida, sem purificar o olhar, a mente, as atitudes. Se quisermos uma vida digna diante de Deus é preciso deixar que Deus trabalhe em nós, isso vai custar; muitas lágrimas vão escorrer dos nossos olhos; sem dúvida, mas é um trabalho que Deus está fazendo para nos tornar felizes; não em coisas quimeras, mas encontrar em Deus. 





[1] Cf. SÃO JOÃO DA CRUZ. Obras completas, Pg. 7
[2] Cf. Ibidem, p. 8                                   
[3] Cf. BERARDINO, Pedro Paulo. Itinerário Espiritual, Pg. 17
[4] Cf. SÃO JOÃO DA CRUZ. Obras completas, Pg. 136
[5] Cf. Ibidem, p. 153
[6] Cf. SÃO JOÃO DA CRUZ. Obras completas, Pg.154


terça-feira, 7 de maio de 2013

MARIA, MÃE E APASCENTADORA

Darlan dos Santos
4º de teologia do Seminário Maria Mater Ecclesiae
Diocese de Bonfim - BA



Contemplando a Santíssima Virgem Maria com a invocação “Maria, Mãe Apascentadora” é sumamente importante olharmos para Cristo que se apresenta como Pastor: “Eu sou o Bom Pastor. O Bom Pastor dar a sua vida pelas suas ovelhas” (Jo 10.11). Compreendemos a oblação de Cristo no mistério da Redenção na Cruz, Ele é o verdadeiro Pastor que por amor se entregou para redimir suas ovelhas. É o evento da Cruz que ilumina a invocação “Maria, Mãe Apascentadora” apartir do texto narrado por São João (19. 25-27):

Junto à cruz de Jesus estava de pé sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria, a mulher de Cleofas e Maria Madalena. Quando Jesus viu sua mãe e perto dela o discípulo que amava, disse á sua mãe: “Mulher, eis ai o teu filho”. Depois disse ao discípulo: “Eis ai tua mãe.” E dessa hora em diante o discípulo a levou para a sua casa.

A morte do Bom Pastor gerou uma morte de amor no coração da Virgem Mãe assim afirma São Francisco de Sales: “Ora, se essa Mãe viveu da vida de seu Filho, morreu também da morte de seu Filho; porquanto tal é a vida, tal é a morte”. “A doce mãe mais do que todos amava, mais do que todos foi traspassada pela espada de dor (Lc 2,35). A dor do Filho foi então uma espada cortante que passou através do coração da mãe, visto que aquele coração de mãe estava colado, junto e unido ao seu Filho com uma união tão perfeita, que nada podia ferir um sem ferir também vivamente o outro” (Teotimo. Livro VII, cap. XIII). A Virgem participou de modo ativo nas dores mortais do seu Filho dando-se a Ele pelo seu Rebanho de modo maternalmente.

É importante considerarmos que a invocação “Apascentadora” está unida a de “Mãe”, pois uma está unida a outra constituindo uma somente. É preciso considerar a maternidade de Maria no plano da salvação apartir do evento da Cruz. Das próprias palavras de Cristo dirigidas a João: “Eis ai tua Mãe” (Jo 19.27) entendemos a maternidade espiritual de Maria em relação ao Rebanho de Cristo. O Rebanho do Bom Pastor O tem como guia e redentor, mas Ele quis que sua própria Mãe participasse do seu ofício de apascentar as suas ovelhas, pois a mesma foi sua “apascentadora” desde a concepção até a Cruz.

Na Encíclica Redemptoris Mater o Beato João Paulo II escreve: “”A mediação de Maria está intimamente ligada à sua maternidade e possui um caráter especificamente maternal, que a distingue da mediação das outras criaturas. Deste ponto de vista, Ela é única no seu gênero e singularmente eficaz… o mesmo Concílio Vaticano II cuidou de responder, afirmando que Maria é para nós a Mãe na ordem da graça” (LG, 61). Recordamos que a mediação de Maria se qualifica fundamentalmente pela sua maternidade divina. O reconhecimento do papel de Medianeira está, além disso, implícito na expressão “nossa Mãe””, que propõe a doutrina da mediação Mariana, pondo em evidência a maternidade. Por fim, o título “Mãe” na ordem da graça esclarece que a Virgem coopera com Cristo no renascimento espiritual da humanidade”.

Maria é a Mãe do Bom Pastor e nossa Mãe na ordem da graça, e por isso temos acesso ao seu Coração materno porque assim quis o seu Filho; Ele no-la entregou a nós que somos o seu Rebanho, a Igreja; Jesus passando boa parte de sua vida ao lado de Maria confia agora ao seu Rebanho para que ele a guarde e deixe-se apascentar pela suas mãos carinhosas. Contemplando Maria como nossa “Mãe”, somos impelidos amá-la como Jesus a amou, com um coração filial e na entrega aos seus cuidados maternais, por isso devemos com toda propriedade chamá-la de “Mãe”.

O segundo aspecto da invocação “Maria, Mãe Apascentadora” é de que Maria é uma mãe solicita e ativa na cooperação da obra do Bom Pastor e é o que afirma o papa Paulo VI em sua Exortação Apostólica Signum Magnum n. 1: “A Virgem continua agora no céu a exercer a sua função materna, cooperando para o nascimento e o desenvolvimento da vida divina em cada uma das almas dos homens redimidos”. A Virgem Maria não é somente a Mãe do Bom Pastor, mas é “apascentadora” das ovelhas redimidas pelo sangue de Cristo, seu Filho. Maria  continua na glória intercedendo pela humanidade ferida pelo pecado para que retornem para o rebanho de seu Filho, que é a Igreja. Antes de sua morte Jesus olhando para Maria diz: “Mulher, eis o teu filho” (Jo 19,26) como num ato de confiar todas as suas ovelhas a sua proteção, ao seu amor; precisamente neste momento que o Bom Pastor confia seu Rebanho ela é constituída “Pasculatrix animarum”, pela sua cooperação na salvação de todas as suas ovelhas. A invocação “Apascentadora” leva-nos a compreender que Maria cuida e guia as ovelhas feridas, desgarradas e cansadas para os prados da vida eterna e para as fontes de água viva que jorram do peito ferido do Salvador, pois do seu seio jorrarão rios de água viva (Jo 7,38) para que bebamos até saciar-se. Podemos atribuir a Santíssima Virgem por analogia as palavras da Amada dos cânticos dos cânticos: “Avisa-me, amado de minha alma, onde apascentas, onde descansas o rebanho ao meio-dia, para que eu não vagueie perdida entre os rebanhos dos teus companheiros. Se não sabes, ó mais bela das mulheres, segue o rastro das ovelhas, leva as cabras a pastar junto às tendas dos pastores” (Ct 1,7-8).

O papa Pio XII confirmava esta invocação quando dirigia algumas palavras significativas a um grupo de peregrinos genoveses no dia 21 de abril de 1940: “A Ela (Maria) que amou a Cristo mais que a Pedro, Jesus confiava na pessoa de João, ao pé da Cruz redentora do mundo, como filhos seus todos os homens, ovelhas e cordeiros de um rebanho reunido e disperso, constituindo-a assim Pasculatrix animarum, Mãe universal de todos os crentes e comparando-a a Pedro, que é o Pai universal de todos, pastor terrestre”.